quarta-feira, 12 de março de 2014

OS VELHOS DO RESTELO

Esta semana, os portugueses foram surpreendidos pelo anúncio de um manifesto a reclamar a reestruturação da dívida portuguesa. Tal manifesto tem o apoio de vários "notáveis", tanto da esquerda como da direita.

A cerca de 2 meses do fim do programa de intervenção da Troyka, não podería haver data tão menos propícia, para anunciar um tal manifesto. Ou seja, Portugal está na eminência de optar pela saída sem programa cautelar, o que obriga ao financiamento nos mercados, sem qualquer rede, e vêm uns iluminados sugerir que a dívida deve ser reestruturada.

Sabendo que a taxa de juro de qualquer ativo financeiro está associado ao risco desse ativo, então, nada melhor para criar mais turbulência nas taxas de juro da dívida portuguesa do que começar a apregoar a necessidade de reestruturar a dívida.

Por outro lado, aproveitando a boleia do tão apregoado manifesto, vêm já alguns dizer que não só a dívida deve ser reestruturada (leia-se extensão de prazos de maturidade), como também as taxas devem ser renegociadas.

Mais uma vez, nada melhor que apregoar a necessidade de alterar taxas de juro, para que as taxas de juro implícitas nos mercados secundários cessem o seu movimento descendente que vêm demonstrando.

Ou seja, nada do que vem no tão propalado manifesto, como receita para a solução da dívida portuguesa, joga a favor da descida de taxas de juro, e, consequentemente, da solução do problema.

Eventuais reestruturações da dívida, a fazerem-se, terão de ser feitas fora dos holofotes dos media, e, preferivelmente, credor a credor. Só assim se pode almejar o tão desejado dois em um. Ou seja, prolongar prazos de maturidade dos empréstimos existentes e não introduzir turbulência nos mercados secundários que fixam, de forma implícita, a taxa de juro da dívida portuguesa.

Aliás, aqueles que consideram que a taxa de juros existente atualmente (4,39% em 12-03-2014) está elevada, não devem ocultar que ela está aos níveis de 2009. Ver no link (prazo para 5 anos)http://www.bloomberg.com/quote/GSPT10YR:IND/chart

Mas a grande maioria dos signatários do manifesto, em 2009, não se insurgiram contra as taxas de juros então em vigor.

É verdade que as taxas actuais são ainda manifestamente elevadas para almejar um crescimento económico satisfatório. Mas uma coisa é certa, não é introduzindo turbulência na vida económica e política nacional que poderemos alguma vez esperar ver os níveis das taxas de juro em redor dos 3%.

Quanto à possibilidade de redução do stock de dívida, já em anterior mensagem referi que a única possível era a resultante do stock de dívida adquirida pelo BCE, a desconto. E como o BCE não é uma instituição vocacionada para ter mais valias com a dívida que compra, e caso os tratados europeus o permitissem, poderia fazer-se um swap da dívida portuguesa adquirida pelo BCE a desconto, por nova dívida a emitir por Portugal.

Ou seja, Portugal emitia dívida nova, a taxas de juro actuais, e o BCE aceitava reduzir o stock que tem em carteira por troca com essa dívida, numa relação de troca que valorizava a dívida em stock no BCE a preços que não ultrapassassem uma valorização correspondente à taxa de desconto do BCE desde a sua aquisição.

Em suma, Portugal ficava a dever um nível de stock de dívida mais baixo (cerca de 30%), embora, muito provavelmente a uma taxa ligeiramente mais elevada. Desde que o valor global da operação fosse positivo para Portugal, e se o BCE a pudesse realizar, era a única redução de dívida admissível.

O único e grande problema é que uma tal operação poderia configurar uma operação de financiamento direto ao estado português, e isso não é permitido pelos tratados.

Toda e qualquer outra redução do stock de dívida acarreta turbulência nos mercados financeiros e é mais perneciosa do que benéfica.


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